quarta-feira, 29 de junho de 2016

FERNANDO PERILLO - SAUDADE DE MINHA TERRA

O cantor goiano Fernando Perillo lançou dois CDs numa só caixa — “Fora da lei” & “Saudade da Minha Terra”. Voz afinada, letras e acompanhamento musical de qualidade apenas confirmam o talento do artista. Pode-se falar que há um mestre interpretando músicas antigas e novas em estado de graça.
A bela música “Saudade da minha terra”, de tão gravada, parecia cansativa, escaldada. Pois Fernando Perillo faz uma interpretação original e a resgata das “mãos” de sertanejos e caipiras — dando-lhe uma dicção moderna, sem voz arrastada e chorosa. Mas sem modernizá-la a ponto da descaracterização.

Um dos pontos altos do segundo disco é a música “Flores pra Cirene”, de Fernando Perillo e Nasr Chaul. Crucial é a interpretação precisa e, ao mesmo tempo, inventiva do poema-canção. A musicalidade do texto de Chaul facilita o trabalho musical do cantor e do violonista Luiz Chaffin. Este, no lugar de competir com o cantor, contribui para dotar o poema de mais musicalidade. Transcrevo a letra, para mostrar a maestria de quem a escreveu (mas é fundamental ouvir a música, que o transforma, ou seja, faz outra poema, agora como música, a partir do texto-base): “Mando flores pra Cirene/Nosso amor na primavera/Mando flores pra Cirene/Da vermelha e da amarela//Um cartão com um poema/O meu sentimento puro/Coração valeu a pena/Esperar pelo futuro//O amor pediu passagem/Despertou da solidão/Transformou toda miragem/Em águas de ribeirão//Plantou flores no deserto/E florestas no sertão/Fez a chuva em céu aberto/E colheu meu coração”.

Chaul decerto prefere ser apontado como letrista, mas também é poeta — tanto que há o lírico, de um Manuel Bandeira e até de um Drummond de Andrade, e a agressividade modernista de um João Cabral de Melo Neto, sobretudo no fim do texto, no qual se diz “transformou toda miragem/em águas de ribeirão/plantou flores no deserto/e florestas no sertão”. Lida com contradições que se integram, de modo esplêndido, menos pelo verismo e mais pela poesia. Com a música, com o ritmo, o poema fica ainda mais rico. A música de Fernando Perillo, pode-se dizer, reinventa a letra de Chaul. Como músicos, compositores e cantores sabem, não basta uma letra bonita para fazer uma música de qualidade. A migração da história, da letra, para a música, para a criação rítmica, é uma tarefa árdua e, às vezes, inglória. Às vezes acerta; outras, não. No caso, deu-se um casamento sincronizado entre letra e música.

O goiano Afonso Felix de Sousa, um dos mais importantes poetas brasileiros, é homenageado com a gravação de “Toada goiana”. Trata-se de outro grande momento do segundo CD do cantor Fernando Perillo.

Se fosse crítico de música, o que não pretendo ser, examinaria passo a passo o CD, tanto a música quanto suas letras, dadas suas qualidades. O principal “defeito” da música brasileira produzida em Goiás é sua qualidade. Se fosse breganeja, ou seja, com um ritmo mais balançante e simplificado, próximo do kitsch consumível nas tardes de domingo do Faustão e outros programas, talvez fizesse mais sucesso além-fronteiras. Qualidade sob a hegemonia da pressa é sempre mais difícil de assimilar e apreciar.
Euler de França Belém 

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