Enquanto
a grande mídia insiste em nos empurrar uma música plastificada, intragável,
insossa, amarga e sem conteúdo, nos rincões desse Brasil sempre tem alguém
fazendo uma música doce, com temperos finos, que faz bem para o corpo e para a alma,
como faz a música deste baiano de Itabuna, Sérgio Di Ramos, que está lançando
seu sexto álbum, intitulado “Com as mãos”, produzido por ele próprio, em
parceria com Charles Williams. O CD conta com 11 faixas, sendo 10 assinadas
pelo artista e uma em parceria com o poeta e escritor baiano Aleilton Fonseca, chamada
“Ladeira do Outeiro”. O disco tem o selo de qualidade da gravadora e editora
Kuarup.
Sérgio
é um artesão no sentido profundo da palavra. Ele produz suas canções, seus
livros, violões, seus quadros, literalmente com “As mãos”, titulo do sexto
filho musical. Orgânico álbum que permite mostrar que o artista exala do
cotidiano a poesia viva, que caminha junto com a melodia extraída de dentro,
onde mora a canção no íntimo do seu ser.
O
artista nos contempla com um vocabulário rico, permitindo adentrar a alma da
palavra e tirar o sumo de seu significado. Um piano dá as boas-vindas na
primeira canção “Última Selfe”. O tema noticia bem a moda das “Selfes”, que nos
retratam momentos, e nunca a alma deles. A música “Com as mãos”, que dá título ao
CD, é um gostoso samba-canção, com o qual o poeta define as funções das mãos. Numa
das canções mais profundas do álbum, o artista, com uma poesia triste, denuncia
e, ao mesmo tempo, alerta sobre a morte diária do velho rio “São Francisco”,
que durante décadas foi o grande braço eleitoreiro do Nordeste. Triste
realidade para as comunidades ribeirinhas que vivem do rio.
Como
escrevi, a música que o poeta baiano veste é orgânica: Na quarta faixa “Erosão”,
o tempo e o que tem dentro dele são tratados de forma única, ímpar. O Sérgio
também é um grande pintor: suas telas são belos poemas pintados, enquadrados de
emoção. Em “Cavalete de Cristal”, o artista pinta seu autorretrato. Nas cidades
interioranas eram frequentes o uso dos sinos de suas igrejas e catedrais para
anunciar as horas, suas festas, seus casamentos e funerais, aqui o artista
canta seu “Sino Senhorio”. Fazia tempo que não ouvia a expressão “Tengo, Tengo”,
imortalizada por Luiz Gonzaga na música “Morte do Vaqueiro”. Sérgio canta
“Tengo, Tengo é o Trem”. Descreve as idas e vindas no metrô de Salvador. Usando
metáforas, o artista canta a bela “Espantalho”. Um autêntico arrasta-pé ouviremos
em “Aboio de Março”: flauta e acordeom, voz e uma vontade arretada de dançar
numa sala de reboco. Uma cantiga se ouve em “Casamento da Raposa”, nela o
artista tem a companhia finíssima do Cello de Shmidt.
Última
canção do disco, “Ladeira do Outeiro”, o artista a veste com sua melodia, o poema
é recheado de lembranças de outrora, do tempo de criança do poeta Aleilton
Fonseca.
Sérgio Di Ramos é esse caixeiro-viajante, menestrel das canções, poeta de imagens e luthier de emoções, que a cada trabalho se entrega de corpo e alma, e quem ganha somos nós.
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